domingo, 12 de maio de 2024

ORAÇÃO A MÃE


João Marques | Garanhuns

Ave, mãe

te invoco santa

pela graça do céu

e a bênção da vida

nessa terra em construção


mãe que multiplica

ama e ampara e toca

dando vida ao ser,

com certeza anjo

que se doou...

ventre seios

e as mãos amigas

da  esperança e da guarda


mãe, bendita  

entre as mulheres

e escolhida entre os homens

para ser geradora

como vaso sagrado

da verticalidade da espécie,

ensina-nos, ó mãe 

a amar a vida

e roga a Deus

pelos filhos desgarrados,

e pela paz do mundo.

Dia das Mães, 12 de maio de 2024.

Recordação

Avenida Santo Antônio, Garanhuns - Década de 1980

Raimundo de Moraes*

Recordar é viver, nos afirma o antigo conceito popular. Assim, atendendo a voz da lembrança, levaremos ao conhecimento dos leitores, através das colunas desde jornal (O Monitor), retalhos de pronunciamentos de nossa autoria.

Iniciando, trazemos um trabalho de fundamento histórico, que apresentamos, a pedido da Direção do Extinto CÍRCULO DE OPERÁRIOS DE GARANHUNS, em 14 de Maio de 1961, há 17 anos, portanto. Eis na íntegra, todo o conteúdo do pálido relato, motivo fundamental desta publicidade.

"Companheiros circulistas: O trabalho que nos propusemos a vos apresentar nesta oportunidade, não iria certamente muito além dos parcos conhecimentos históricos de que dispomos para o seu natural e indispensável desdobramento. Contudo, conforta-nos a certeza de que não o fizemos para os doutos, tampouco para os cientistas e pesquisadores do passado. Estes, e aqui entre nós estiverem, estamos certos saberão, com a consciência e a segurança do que aprenderam, relevar as falhas históricas porventura ocorridas no decorrer desta nossa modesta contribuição, à festa do Jubileu de Prata, do Círculo Operário de Garanhuns. Um notável escritor paulista, fixando para à história dos nossos dias, nas páginas de famoso livro em que, com rara felicidade, traçara a biografia política de um nosso patrício bandeirante duramente injustiçado, pela frieza e pela revoltante maldade dos homens do seu tempo, com irresistível segurança, emitiu o seguinte pensamento:

"Se eu tivesse vindo à terra na época dos apóstolos, e se me fosse dada uma parcela da humildade evangélica que integrou à pregação das sabedorias cristãs, haveria feito minha jornada pelo mundo, a serviço deste Lema: "Negue-se o pão, mas não se negue a verdade".

Assim, baseados nesse poderoso conceito e levados pelo nobre interesse de bem servir, é que havemo-nos preparados para o trabalho que, neste ensejo, declaramos dedicá-lo aos circulistas, como pálida ajuda à grande obra dos Círculos Operários, em tão boa hora frutificando por todos os quadrantes do Brasil.

Mesmo por que, - a verdade sobre tudo - foram as palavras do Divino Mestre, no famoso sermão da montanha histórica. E a verdade sobre tudo - também disseram os Apóstolos Santos, nos seus sagrados evangelhos.

E a verdade sobre tudo - ainda hoje continua sendo pregada a todos os povos, através dos sábios ensinamentos do Cristianismo. Respeitando, assim, esse divino princípio é que, em verdade, vos diremos: não ireis tomar conhecimento de um trabalho diferente daquelas constantes lições que tendes recebido nesta casa, onde o pensamento circulista vive e fecunda-se para a continuação de uma obra inteiramente voltada para o bem da humanidade.

O assunto que nos foi imposto para o desdobramento deste trabalho, embora muito pouco difundido, entre os circulistas, em suas linhas gerais, acredito que o mesmo acontecendo à maioria dos que cultivam a ciência nos seus variados aspectos nunca nos foi ausente, precisamente por que a presença do sofrimento físico e espiritual, aliados à ânsia incontida que revelamos por uma paz eterna no Reino Celestial, o tem conservado latentemente em nossos corações. O desejo de todos, os que aqui se encontram e muito particularmente daqueles que  se tornaram circulistas por amor à causa coletiva - como foi o nosso caso - é precisamente velar para que possamos, à luz da verdade, apresentar um panorama novo em face dos atuais acontecimentos que envolvem os destinos do mundo.

Quando porventura nos afastamos do terreno da experiência, muitas vezes dúbios e ofuscados pela nuvem da ignorância que nos envolve, conturbando os pensamentos, nos acerca aquela vontade firme de penetrarmos, com firmeza de atitudes, no campo claro da realidade.

Por isso, sejam quais forem as consequências e os resultados, nunca deveremos esposar quaisquer sentimentos, doutrinas ou ideologias que se inclinem a negar a existência de DEUS.

Alguns poucos que têm pretendido prova a inexistência do Criador dos Mundos, sem grandes resultados práticos afinal, contudo nos dão conta das coisas criadas, desde as criaturas humanas, como seres superiores a mais  insignificante molécula do Centro de Vibração, representados nesse harmonioso conjunto da vida universal. Para tanto, consideremos:

"Não há nenhuma dúvida, quanto ao fato de estarmos vivendo uma época completamente nova, em relação aos conhecimentos da humanidade. Por isso, o próprio DEUS na sua divina sabedoria, preparou o espírito dos humanos, homens e mulheres, tal como se devem tornar necessários para a grande redenção da Alma, após a celestial jornada". (*Médico e jornalista | Garanhuns, 25 de março de 1978).

Salve o Dia das Mães

Luzia Gueiros de Barros, mãe de Anchieta Gueiros

Jesus de Oliveira Campelo* | Garanhuns

Neste dia dedicado às mães, prestamos nossa homenagem a essas criaturas divinas que neste mundo receberam do Criador a sublime missão e o privilégio de gerar filhos. Todo ser humano deve se sentir feliz por estar junto dessa figura que chamamos de Mãe, Mamãe ou Mãezinha! Este tratamento carinhoso é dirigido pelos filhos, principalmente nos primeiros anos de suas existências, para chamar aquela que dispensa aos familiares, a mesma atenção, e sempre está pronta a atender aos apelos e às suas necessidades, a qualquer hora do dia e da noite.

É importante frisar, que ela dispensa igual tratamento e a mesma ternura a todos os filhos, sempre demonstrando alegria, carinho, equilíbrio, e o faz de forma incondicional, pois, não exige retribuição pelas tarefas realizadas.

Sua missão é: dar sem nada receber. Seu maior  objetivo: a felicidade do filho. O amor profundo que a mãe sente pelo filho é algo que nasce de sua própria formação biológica e espiritual e que, para o homem entendê-lo e consagrá-lo, terá de estudar e analisar, profundamente, estrutura maternal. O amor materno é o símbolo da felicidade, da paz e que não precisa ser adquirido, pois faz parte da própria formação da mulher. A afeição que ela nutre pelo filho é, sem dúvida, o mais elevado tipo de amor e o mais sagrado de todos os vínculos emocionais; ele difere dos demais relacionamentos, porque estes objetivam, apenas, a troca igual de afetos e carinhos ou na satisfação de desejos das partes envolvidas. Mas, a mãe não ama apenas um filho; ama a todos com a mesma intensidade, dispensando-lhes, sempre, os mesmos cuidados. Só em casos de dificuldade, ausência ou doença, ela pode dedicar mais atenção e mais amor, ao que está distante ou ao que estiver necessitando de maior cuidado.

É uma pena que alguns filhos não saibam reconhecer e agradecer por todos os cuidados. E o amor que lhes foram dispensados pela mãe e não procurem retribuí-los. Às vezes, isso só acontece depois das lições recebidas ao longo da vida, ou após sofrer grandes decepções, desenganos e desilusões. E, ao voltar à casa paterna, - que maravilha! encontra a boa mãezinha de braços abertos, feliz, e pronta para curar-lhe todas as feridas. A partir daí, ele certamente vai se lamentar e se arrepender por não ter reconhecido o tesouro que durante tanto tempo esteve ao seu lado, mas, que não soube valorizá-lo, como devia.

E os que já a perderam? Neste dia surge a lembrança da mãezinha querida que está distante, habitando em outra dimensão, mas que, com toda certeza, continua a dispensar-lhe o mesmo amor e a mesma ternura de antes. Certamente, daria tudo para tê-la de volta, sentir seus afagos, beijar sua fronte, abraçá-lo e dizer com toda força do seu ser: - que saudade mamãe, eu sinto de você!

Como gostaria de neste dia poder estar ao seu lado para agradecer por tudo que você fez por mim! Oferecer-lhe uma rosa e dizer-lhe que você foi a criatura mais extraordinária que já tive em minha vida! Mas, para compensar essa ausência e essa saudade, ao abraçar neste dia sua mulher, diga-lhe com muito amor e carinho que ela é o maior tesouro que você tem na vida. E, para saudar nossas queridas mãezinhas, vamos oferecer-lhes um trecho do poema, Mãe, de Giarone: "Mãe, nos teus braços em me transfiguro! Lembro-me que fui criança, que fui puro! Sim, tenho mãe, e esta ventura é tanta, Que eu agora sei o que significa: O homem é pobre, mas,  a mãe é rica! O homem, mas a mãe é santa! Santa que fiz envelhecer sofrendo, Mas, que me beija como agradecendo, Todo mal que por mim te foi causado. Dos mundos onde andei nada te trouxe, Mas, tu me olhas com um olhar tão doce, Que nada tendo, nada te falta nada. O dia das mães é dia da bondade, Maior que todo mal da humanidade, Purificado num amor profundo. Por mais que o homem seja um ser mesquinho, Enquanto uma mão cantar junto a um bercinho, Cantará a esperança para o mundo".

Neste dia de tanta significação, desejamos que as mães de todo o mundo recebam as merecidas homenagens dos seus esposos, filhos e o respeito, cada vez maior, da humanidade.

Sandoval Ferreira - Mãe é exemplo de vida

Cultura Popular

Direção artística: Everton Kelly

Direção Musical: Gido Silva

Percussão: Fabricio Vasconcelos

Mixagem: Juka Mix

Produção: Michael David

SANDOVAL FERREIRA

Sandoval Ferreira nasceu em 27 de fevereiro de 1983, em Iati, Pernambuco. Morou no Sítio Aguazinha até os seus 15 anos. Filho de  pais pobres morava numa casa sem energia onde a principal atração à noite era a luz de candeeiro a gás. O pai reunia os vizinhos e seu irmão mais velho era quem lia os folhetos de literatura de cordel. Depois Sandoval passou a ler e despertou o interesse pela poesia.

Aos 15 anos mudou-se para o Povoado Bela Vista, também em Iati, onde fez muitos amigos, viveu por lá até os 22 anos.

Aos 18 anos de idade fez uma apresentação de cordel em sua escola para o secretário de educação de Pernambuco, sendo que todos gostaram, foi o que lhe deu motivação para seguir em frente. É técnico agrícola e reside em Garanhuns.

Publicou os livros e CDS: Meu Sertão em 12 Versos - Causos Nordestinos, Porteira Velha se Abrindo Faz Meia Lua no Chão e o CD Humor Cordel e Repente.

Política e hospitalidade

Prefeito Ivo Tinô do Amaral

José Benigno*

Há séculos passados, um sujeito ilustre, muito importante mesmo, se, não me engano, Fustel de Coulanges, escreveu um livro que se tornou clássico na literatura política, chamado a "Cidade Antiga".

Nesse livro ele dizia que toda cidade tem a sua virtude, aquele traço característico de experiência e de concreção, pelo qual as cidades se identificam e se distinguem uma das outras.

Garanhuns oscilando na casa dos cem mil habitantes é uma cidade em franco processo de expansão urbanística, de vida dinâmica, de povo acolhedor e hospitaleiro, com belos logradouros públicos e pontos turísticos fascinantes.

A Suíça Pernambucana é como é cognominada pela exuberância do seu clima, tipicamente europeu, também se ufana de ter a sua virtude, que eu penso seja a virtude da hospitalidade, isto é, a virtude de bem receber. Receber com alma, com atendimento, com afeto, com toda a doçura do verbo receber como aconteceu recentemente por ocasião da VI Convenção Nacional de Clube de Castores.

Garanhuns não é somente um "cartão postal" convidativo e insinuante para o turista. É também uma cidade acordada para o seu próprio desenvolvimento. Garanhuns recebe com elegância ímpar, carinhosamente, educadamente - todos os que aqui chegam para ficar, ou que aqui estão para passear; forasteiros ilustres ou peregrinos humildes, aqui a todos nós recebemos com o afeto, com a alegria, com a alma de Garanhuns.

Palavras significativas e que, certamente definirão o raciocínio deste artigo. Palavras de um homem público, e de um "gentleman" também. Palavras do prefeito Ivo Tinô do Amaral aos jovens castores do Brasil que partiram com o coração ensopado de saudade dos dias felizes que passaram na Suíça Pernambucana, onde cada gesto, era um traço peculiar e intrínseco do seu povo e da sua gente hospitaleiras.

Durante cinco dias tivemos a satisfação incontida e porque não dizer a rara oportunidade de concatenar ideias, fazer exposições de pensamentos com companheiros castores do Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Bahia e Pernambuco - numa série de inovados fóruns e seminários.

Estes e outros eventos especiais, fórum castorístico, noite de companheirismo (no Parque Ruber van der Linden), desfile, jantar de confraternização, três Plenárias Nacionais, baile em homenagem ao Lions Internacional (no Hotel Monte Sinai), jantar em homenagem ao comércio e á indústria, passeio a Caruaru, competições esportivas, escolha da Miss Castora do Brasil, missa em ação de graças e culto no Mosteiro de São Bento - tiveram lugar na cidade das flores durante a VI Convenção Nacional de Clubes de Castores.

Vagueio no tempo e recordo a cidade amada do companheiro Marcílio Luna, onde estão ilhados os sonhos e amores eternos, perdidos nos mistérios do tempo, de Edite Correia de Moraes, Fernanda França, Graciete, Grace e Alma Brandt, Ana Carolina Torres, Teresa Pinto, Luciene Gonçalves de Lucena, Neide, Maria Helena Sedrin, geração que encanta e fascina a sociedade da cidade serrana.

Oito anos depois - volto agora mais demoradamente à cidade de Garanhuns. Volto a sentir o frio gostoso, a contemplar a neve que espalha por cima dos telhados, a sentar nos bancos dos jardins poéticos do Sesc, que exalam perfume e aroma, a abraçar Lúcio Mário, Dagoberto e Antônio Edson, conterrâneos meus a bem servir a grandeza do município.

Volto a abraçar João Eudes Bezerra, (funcionário do Bandepe) e ex-companheiro de magistério, entre outros amigos leais que hoje povoam o solo de Garanhuns. Volto radiante e feliz e com uma dupla missão: participar do evento como Castor e como jornalista, naturalmente cobrir o acontecimento para o JORNAL DO COMMÉRCIO E O DIÁRIO DA NOITE.

E em meio a este reencontro feliz, conheci novos companheiros e companheiras, somei, multipliquei os laços de amizades que unem a mocidade castorística brasileira, dos pampas gaúchos (no Rio Grande do Sul), à pequena cidade de Cabrobó, nos confins do sertão de Pernambuco.

Diz o velho adágio: Há tempo para todo o propósito debaixo do sol. E para mim, houve tempo de trabalhar e tempo de amar; tempo de rever os amigos e tempo para fazer novos amigos; tempo para dialogar e tempo para discordar.

Tempo de bater papo em inglês com Silvana Antunes (CC de São Paulo) e tempo de rever os nossos erros de Português.

Tudo isso e muito mais, aconteceu na cidade das flores, que se transformou de um momento para o outro - na capital do castorismo brasileiro. Vagueio no tempo e sinto saudade, saudade que (fez) faz lembrar os olhos verdes da esperança de Ana Carla Martins Lemos, garota de porte fidalgo, gestos meticulosos. Saudade dos companheiros de Goiás, a começar pelo Mário Júnior Balestra; Saudade dos irmãos Paulo Goberto e Carmem Lúcia, filhos do leão - Dorival Ferreira da Silva e da domadora Edenlice Maria Vieira Ferreira da Silva, pertencentes ao Lions Clube de Salvador - Sudeste; Saudades do CL Pedro Matjosius e de sua domadora; Saudade do diálogo alegre e descontraído do companheiro gaúcho Tarcísio Barrotte, que se disse um enamorado dos costumes do homem do agreste, do seu "modus vivendi" da sua simplicidade.

E em meio a estas lembranças arquivadas, uma alegria maior conduze-nos a novos horizontes. A eleição do CC Rolmes Medeiros de Carvalho Júnior para presidência do Conselho Nacional de Governadores, antevê para Pernambuco e o Nordeste nesta hora, o futuro do castorismo, a grandeza do Brasil. Rolmes, por certo continuará o trabalho fecundo do CC Alfredo Fabiano Reis, que teve ao seu lado a ajuda de admiráveis companheiros como Vagner Robues Alvarez, Cícero Ferreira da Silva, João Felipe Furtado, entre tantos outros.

Ao chefe do Poder Executivo de Garanhuns, Ivo Tinô do Amaral, a nossa palavra de gratidão, extensiva a todo o seu staff, especialmente ao seu Secretário de Governo, José Florêncio, pela amabilidade com que fomos tratados, pela deferência toda especial que naturalmente só poderia existir numa terra que acolhe com hospitalidade quase que diariamente turistas do Brasil e de todo o mundo, atraídos pelo fascínio da sua natureza e exuberância do seu clima típico dos países europeus. Se é um orgulho ser Castor, maior ainda é tê-los como meus companheiros! (*Jornalista, professor e analista político | Recife, 27 de Agosto de 1977).

Valdemar Tinô de Medeiros

Valdemar Tinô de Medeiros

Faleceu em Recife, no dia 19 de março de 1978, o Sr. Valdemar Tinô de Medeiros, prefeito do município de Calçado - PE. Filho de Belarmino Claudino de Medeiros e Adelina Tinô de Medeiros, nasceu Valdemar naquele município pernambucano em 22 de setembro de 1924. Casado com a senhora Valdelice Almeida de Medeiros e pai de 9 filhos.

Funcionário público do Estado de Pernambuco, homem abrangente, comunicativo, cedo ingressou na política do seu município, tendo sido eleito vereador por duas vezes o mesmo ocorrendo com o cargo de prefeito. Eleito no ano de 1977 a função de Presidente da CODEAM, onde se houve com muita largueza de visão, abrindo novos caminhos entre esse órgão e os vereadores dos municípios ali associados.

Seu sepultamento ocorreu às 17 horas da segunda feira, 20 de março com grande acompanhamento. Sua imagem fica no meio do povo, que em prantos levou-o a última morada. O corpo esteve em Câmara ardente durante parte do domingo e segunda-feira, donde foi levado para a Igreja Matriz, realizando-se uma missa de Corpo Presente concelebrada pelos padres Pedro e Otoniel Passos. Falaram em homenagem à sua memória o Pastor Henrique de Lima Guedes, da Igreja Presbiteriana do bairro da Boa Vista no Recife, Sr. Jaime Pinheiro representando o prefeito Ivo Amaral de Garanhuns, Lídio Cosme, prefeito de Lajedo, Cel. Augusto Tavares comandante do 71º BI Mtz, em nome da CODEAM, Natanael Pereira, agente fiscal do Estado, Arlindo Tenório de Miranda promotor público de Calçado e finalmente o Sr. vice-prefeito que por força das circunstâncias assumiu o comando do município, Sr. Antônio Francisco da Silva, em nome do povo de Calçado.

Calcula-se que mais de quatro mil pessoas compareceram as solenidades fúnebres. Quase todos os prefeitos e ex-prefeitos do Agreste Meridional fizeram-se presentes, partilhando da dor do povo de Calçado. (Transcrito do jornal O Monitor de 25 de Março de 1978).

Anchieta Gueiros

 Anchieta Gueiros em 1970 

sábado, 11 de maio de 2024

João Domingos da Fonseca

João Domingos da Fonseca "Joca" e Mário Matos - Carnaval em Garanhuns na Rua do Recife na década de 1930

Alberto da Silva Rêgo*

Conhecido por "Joca", advogado, jornalista, residiu por muitos anos na Rua do Recife, é nomeado, em 1932 Fiscal Federal do Ensino, para o Ginásio, substituindo o Dr. Clínio Mayrink, ambos rigorosos na fiscalização no período de provas, não admitindo "filas". Esta tarefa era fácil pois as turmas não ultrapassavam três dezenas. A nossa iniciou-se com 28 alunos no 1º e terminou com 4 no 5º ano. Apesar do rigorismo do Dr. Joca a turma gostava dele, o homem que vivia nos cartórios, na Farmácia de Péricles, na loja do "Seu Matos", no primeiro, cuidando dos clientes, no segundo, o "bate-papo" e, no terceiro lugar, ouvindo aquelas "estórias e comentando depois: "acredite se quiser, mas que falou, falou"...

No Diário de Garanhuns era o "Zeno Cova" e também "João do Mato", mas se pisassem nos seus "calos", não havia dúvidas: resposta imediata e a sua assinatura no final do artigo. A sua letra era quase indecifrável. Como auxiliar de tipógrafo, algumas vezes, cabia-me a tarefa de compositar a crônica do Joca. Quando não conseguia decifrar a palavra o jeito era substitui-la por uma similar, o desfecho vinha sempre no dia seguinte ao ir receber a "matéria nova". Saia sempre um "palavrão" - tipógrafo analfabeto... era o mais suave. Mas às vezes ao ser procurado com o objetivo de "decifrar" seus hieróglifos, dizia: "quem diacho escreveu isto"... Inúmeras ocasiões ocupou o cargo de Diretor do Diário de Garanhuns. Na primeira crônica, com o título "Assuntando", dizia o seguinte: "Esta coluna sairá todos os dias. O assunto será variado. Atraente, dirá o leitor, se o for. Falar-se-á de tudo: de política, de socialismo, de religião, movimento internacional, de economia, de finanças, etc. Dissertar-se-á à moda brasileira, sobre o que se entende e o que se não entende". E comenta "as leis brasileiras que são feitas pelos legisladores para solucionar problemas particulares". Em seguida analisa o balancete de uma Prefeitura (?) e, assim termina: "É considerando essas razões que eu sempre penso que quando uma Prefeitura apresenta grande saldo, o Sr. Prefeito é dotado de um Regular Saldo de Burrice". De João Alberto, líder revolucionário de "1930", diz: "Talvez a mais alta expressão da coragem, da intrepidez entre os companheiros de classe". Em outro escrito": "O Brasil é um imenso território que se estende do Acre ao Rio Grande do Sul. Portanto, NORTISTA TAMBÉM É BRASILEIRO". Em outro artigo "Apela para a comunidade ajudar aos pobres que só conhecem da vida - miséria, frio e fome, nudez e doença". Fala "às mocinhas que, ao retornarem das aulas, não estejam a arrancar as folhas das árvores." Entra na área internacional e comenta a Conferência Mundial de Londres e diz: "Que o Brasil tome a lição. Cuide antes e acima de tudo dos seus legítimos interesses. Conservar uma amizade é bom. Mas, é preciso que se seja, principalmente, amigo de si próprio". Comentando a intolerância religiosa, em certas cidades (que diria, hoje da Irlanda?...), em Assuntando, escreve: Aqui a par da crença católica, nós vemos florescer o evangelismo com diversos templos e seus cultos muito concorridos.

Há os Centros Esotéricos.

Multiplicam-se os Centros Espíritas.

A Loja Maçônica toma vulto todo os dias.

Com a mesma segurança que sai uma procissão, faz-se um culto protestante na praça pública.

E isso é um sinal de civilização".

O Joca folião se exalta e fala da AGA e do Sport: "Os Bailes da AGA e do Sport". - Que beleza. A gente tem vontade de transformar o mundo num daqueles salões e parar o sol, lá da outra banda, para que nunca chegue o domingo...".

Referindo-se ao incêndio ocorrido na AGA, num festejo carnavalesco, Zeno escreve: "Mas há um fato que eu quero registar de um modo especial. O gesto elegante do Sport, em face de trágicos acontecimentos na AGA. Ninguém mais em condições de compreender e exaltar a beleza do gesto do Sport do que este paulificante escrevinhador do Assuntando.

A gente passa por transformações extraordinárias.

Houve um tempo em que eu tinha um ódio medonho ao Sport Club. Agora vejam a imbecilidade: só porque existiam lá uns três ou quatro cidadãos dos quais eu não gostava. Por isso é que eu estou aparelhado a salientar o gesto cavalheiresco do Dr. Luiz Guerra, mandando acabar, imediatamente, o baile do Sport, que se pronunciava magnífico, tão depressa teve conhecimento de que o fogo bailava no salão da AGA.

E também a solidariedade dos associados "rubro-negros".

Agora o crítico dos "perfis", entrando na mesma seara e, em "Galeria de Retratos", perfilando algumas personagens tais como: W. W. Thompson, Dario Rêgo, Arcelino Matos, Bernardino F. Guimarães, Eurico Lira, Edmundo Jordão, Antonio Paulo de Miranda, Arlindo Coelho e Morse Lira.

Eis a crônica de Joca sobre o Diarinho: "Vale a pena a gente fazer jornal no interior? Relativamente ao presente, Não. Faltam dinheiro, leitores assinantes e notícias, além de poucas pessoas terem interesse em jornais. As notícias são muitas delas velhas e assuntos repisados. Mas, para o futuro, o jornalzinho tem um valor danado. Quando se quer saber de um fato passado, recorre-se a uma coleção de jornal. É aí que o leitor vai reconhecer o trabalho do jornalista que levou o seu tempo a ouvir indiretas, a ser chamado no mínimo de vagabundo".

Agora o Dr. Joca, advogado:

A gente sabia, ele não aceitava defender determinadas causas, não por desconhecimento, mas por questão de "fôro íntimo". Mudando-se para a capital do Estado, foi exercer a profissão na Corregedoria do Estado. Nas horas de lazer andou colaborando no DP., com o pseudônimo de João do Mato.

Um dia fui procurá-lo. Precisava dos serviços profissionais de um advogado. O meu ex-patrão Zeno Cova, de quem me tornara amigo e admirador, não podia deixar de ser o escolhido. Aceitaria a minha causa? E porque não. Um contrato verbal - pagamento das custas do processo em caso de perda e se vitorioso, acrescido de uma remuneração advocatícia. A questão contra Universidade Rural de Pernambuco. Eu era Livre-Docente da cadeira de Pomi-Horti-Silvicultura, por concurso público. Na ausência do titular, por licença para tratamento, requeri a Cátedra. Negada. Foram 12 anos na Justiça. Ganhamos em todas as instâncias, inclusive, no final - Superior Tribunal Federal com o despacho: - DADO PROVIMENTO POR UNANIMIDADE".

Quem pagou o "pato'? Os que na Escola de Agronomia deram parecer contrário? Não. O Governo Federal a determinação do cumprimento da Lei e, obviamente a indenização devida. Neste final decisório João Domingos da Fonseca já havia falecido. Cumpri o trato com os seus familiares, ao receber a devida indenização.

Certa oportunidade, a fim de tratar do assunto acima ventilado, num sábado, fui visitá-lo. Nesse tempo, eu possuía um jeep. Após a conversa pediu-me que eu o levasse a uma padaria. Ali, adquiriu uma quantidade enorme de pães e fomos, com tal encomenda, fazer a entrega no Hospital Infantil. Disse-me que era uma velha promessa que cumpria religiosamente. Temos, aí as facetas de João Domingos da Fonseca, garanhuense pelo coração e descendência numerosa, brotada naquela terra, que legou à Pátria.

Saudades de Inhumas

Garanhuns Antiga/Feira Livre

João Correia Filho*

Pela vida afora, transporto-me, muitas vezes, a Inhumas para rever e sentir, através da imaginação, um oásis de beleza e tranquilidade campesina que conheci e vivi nos meus tempos de criança. Berço dos meus ancestrais, a Inhumas dos verdes canaviais e rios cristalinos de outrora, com seus velhos engenhos de fazer rapadura e seus hábitos de trabalhos simples e primitivos, quando, de calças curtas, tangia bois e vivia mergulhado naquele sadio bucolismo cuja poesia não sabia perceber, volta, hoje, rediviva e saudosa, grandiloquente e poética: é que, como tão bem disse, uma vez, o grande mestre Ataulfo Alves, "eu era feliz e não sabia".

Evoco a felicidade estampada nas faces de minha querida Mãe, de tão saudosa memória, que nasceu e se criou no verde e próspero rincão, cultivando a agricultura e saboreando a sua paisagem, em contato direto com a singeleza e serenidade dos campos, que a tornavam feliz e realizada.

Inhumas, o oásis do Agreste Meridional, não ficou abismada na beleza de suas densas e características matas nem no suave marulhar de suas cristalinas e mansas correntes; não, os poetas a descobrirem: a Cachoeira de Inhumas foi decantada em prosa e verso e tronou-se a menina dos olhos do Dr. Celso Galvão, hoje também na eternidade, mas vivo na lembrança de sua posteridade.

Dentre os de média idade, quem não se recorda da grande e ilustre família dos Teixeiras de Inhumas? Educados segundo os princípios do Santo Evangelho, tornaram-se, consequentemente, uma comunidade pacífica e ordeira e sinônimo do conforto e da pujança de Inhumas. Como eméritos anfitriões, revelavam o máximo prazer em receber, em suas fartas residências o pessoal da cidade, notadamente os pastores que para lá se dirigiam em suas missões evangélicas, merecendo aqui, honrosa menção o nome do pastor Dr. Uzzae Canuto, figura de destaque nas letras, na sociologia, na filosofia, inteligência privilegiada e polivalente que nos primórdios da preeminência da Inhumas dos Teixeiras, figurava frequentemente entre os visitantes ilustres do mais feliz dos recantos. Sob a égide dessa insigne linhagem, Inhumas representou, em certa época, a hegemonia de parte da economia de Garanhuns, através de sua exuberante produção de rapadura, café, pecuária e frutas.

Nestas rememorações, com que ora me transporto à áurea e florescente Inhumas de um passado que não voltará jamais, ocorre-me à mente e até aos ouvidos uma sinfonia que, por mais paradoxal que pareça, era ao mesmo tempo, agreste e sonora: refiro-me à melodia prolongada, resultante do movimento dos carros-de-boi de Inhumas, que, transportando a rica produção de seus engenhos para a cidade, davam às madrugadas dos sábados garanhuenses uma sonoridade característica e indicativa da aproximação e esperteza dos madrugadores campônios, que, antecipando-se ao nascer do sol, vinham abastecer a metrópole ainda semi-adormecida. O folclore de Garanhuns, como que para prestar uma homenagem aos laboriosos carreiros eternizou-lhes a lembrança, criando a tão conhecida história do carro-de-boi encantado.

Hoje, decorrido muito tempo, a Inhumas dos meus ancestrais e dos meus memoráveis tempos de criança não tem mais o seu fascínio e nem posso recordá-la sem sentir e sofrer a dolorosa e cruel transitoriedade das coisas, capaz de fazer de inesquecível paraíso terrestre uma quimera de sofridas recordações.

Desejamos construir a Inhumas de minha fantasia, comprei, quando já morava em Recife, uma propriedade no sagrado rincão de meus avós. Mas Inhumas estava mudada, descolorida, desfigurada. Muitos parentes tinham morrido. Outros tinham vendido suas propriedades e emigrado para outras regiões do País. Era impossível reagir à ação destruidora do tempo e reviver as emoções de um tempo que jamais voltaria.

O Governo do Estado, como era para completar a desfiguração de Inhumas de minhas saudades, resolveu tornar realidade um sonho de milhares de garanhuenses: construiu a Barragem de Inhumas. Assim, a Inhumas que abastecera a cidade outrora com a produção agrícola de seus férteis campos, iria abastecê-la, agora, com suas águas cristalinas. Era o dedo do progresso a impor mudanças. Garanhuns passou a saborear abundantemente as doces águas de Inhumas, mas esta passou a ver, mais e mais, sua descaracterização, com as volumosas águas da Barragem a sepultar muitos de seus minifúndios. Era o completo desaparecimento da aprazível paisagem dos campos agrícolas de Inhumas e de seus velhos e saudosos engenhos. Era o fim de um éden bucólico e opulento e o surgimento de uma outra paisagem, também necessária e útil, mas com as marcas que o progresso costuma imprimir, isto é a destruição e desfiguração das belezas naturais.

Ao concluir estas rememorações sobre Inhumas, devo registrar que, como proprietário no belo rincão que tentava reconstruir e cultivar, ainda tive o prazer de receber visitas ilustres, convido assinalar, com muita honra, a do Governador Eraldo Gueiros Leite, que foi hóspede em nossa casa, a do então Prefeito de Garanhuns, Amílcar da Mota Valença, visitas do Presidente da CELPE, Dr. Nicodemos Lopes Pereira, todos estes, amigos meus de particular amizade. Devo assinalar também as visitas do Rotary, do Lions e da Maçonaria da querida Garanhuns. Hoje, que não mais sou proprietário em Inhumas, resta-me lembrar, com saudades, a Inhumas dos meus antepassados e a minha geração. (*Recife, 15 de outubro de 1977).

O Diocesano de Garanhuns

Dom Expedito Lopes

Antônio Vilaça*

Reli o Diocesano de Garanhuns, do meu ex-colega ginasiano, Manoel Teixeira, e confesso, com maior dose de entusiasmo. O livro traz o retrato do nazareno Dom Moura, que me vestiu batina, bem como, o retrato de Dom Paiva que me tirou a veste talar. Traz, também, o clichê de Mons. Anchieta Callou, que me ensinou Latim e Português, como traz o clichê de Dom Expedito Lopes, por quem rezo, todas as noites uma Ave-Maria, em agradecimento e uma graça recebida por seu intermédio. Uma vez, eu estava ajoelhado no túmulo de Dom Expedito e me olhando o Mons. Anchieta Callou que me censurou o fanatismo. Respondi-lhe que estava, somente, agradecendo uma graça que recebera por seu intermédio. Por sinal, tenho e li, o livro A Mitra e a Bala, de Ana Maria Cesar, pois o meu ex-colega de batina Hosana de Siqueira e Silva foi quem matou, com tiros de revólver, Dom Expedito. Fiz filosofia e dois anos de Teologia, pois sendo paraibano, Dom Paiva mandou cinco seminaristas para João Pessoa e só eu sei o que sofre do Mons. José Tibúrcio de Miranda reitor do Seminário, tendo por sinal, o álbum ilustrado sobre o Convento de Santo Antônio, que me mandou Dona Glauce Burity, vendo-se a janelinha do primeiro andar do Convento, onde fiquei os quatro anos que passei na Paraíba. Mas, voltando ao Diocesano, do meu ex-colega, relembro o Padre Agobar bem como, as Valenças, e para não citar todas, pois, a "ladainha" seria sem fim, cito, apenas, Dona Emília, amiga do Padre Luna, meu ex-vigário de São Bento do Una, e que ia, muito, ao Sítio, onde eu morava, perto de Lajedo. O livro, do meu ex-colega, foi prefaciado por um ex-juiz de Surubim, o Dr. Jones Figueiredo, que exalta Manuel Neto. Como num caleidoscópio, voltei ao Diocesano, dizendo que um dos meus oito livros, inclusive, o Histórias que Limoeiro Conta, nem, de longe, imita o livro que acabo de tresler, ou mesmo de treler, com inusitada satisfação, um livro que eu deveria grafar com todas as letras maiúsculas. Mas não poderia dizer, pois o tempo que a Rádio Difusora me dá não pode ser extrapolado. (*13 de maio de 1995).

João Domingos e Mário Matos


João Domingos da Fonseca "Joca" e Mário Matos - Carnaval em Garanhuns na Rua do Recife (Atual Dr. José Mariano) na década de 1930. 

Professor Manoel Vieira

José Francisco de Souza

Dr. José Francisco de Souza*

Temos problemas de várias ordens e nem sempre destacamos o maior. O incremente da tirania, multiplica os conflitos individuais e coletivos. Certo é que, nunca estamos livres. Fatos de modalidades diferentes sempre nos confundem. Por mais que imaginemos não é possível dominar o voo das nossas intenções. Esse é um comportamento que sempre deixa muito a desejar.

Nesta vida, o certo, é que não há segurança. Toda segurança é um ilusão, contudo, não implica em buscarmos o oposto. Não devemos desejar, nem contribuir para que o desagradável nos aconteça. Isto é óbvio. Total ausência de um proposito orientador na vida não seria possibilidade de bom senso. Por falta de apercebimento, a cada momento estamos nos surpreendendo. Vivemos sempre ao lado dos que agredir é o verbo usado em todos os tempos.

Eles se cruzam por todos os recantos das ruas da nossa cidade das flores. Em dias do mês transato o nosso grande professor Manoel Vieira, foi vítima de um atropelamento por um ciclista que abusivamente pedalava pela calçada da nossa Rua 15 de Novembro, nas imediações, ou mesmo na padaria da mesma rua.

A vítima é um homem circunspecto e cauteloso. Movimenta-se com a prudência característica à sua idade provecta. Sempre foi dotado do profundo autoconhecimento em todos os momentos de suas atividades profissionais. Nem por isso conseguira evitar o ato criminoso do dirigente do veículo, que vertiginosamente desfilava imprudentemente pela calçada. Calçada não é pista de veículo. Esse abuso é costumeiramente repetido todos os dias. Vários acidentes dessa natureza se repetem. Isso acontece muitas vezes, à presença de guarda e sem que se tenha tomado as providências cabíveis em lei.

Entendemos que os responsáveis pela ordem e segurança de trânsito em Garanhuns, deve considerar mais à vida do ser humano. Proibindo que menores pedalando bicicleta pelas calçadas. Calçada não é pista de corrida. Geralmente as crianças sempre se deslocam de casa para rua às carreiras, momento em que serão fatalmente vitimadas pela irresponsabilidade dos outros. O regulamento de trânsito aqui na terra do Magano, se existe, parece que não funciona. Rigorosa fiscalização está a exigir, nesse sentido.

Calçadas não são destinadas ao tráfego de bicicletas. E sim às pessoas humanas, sem coação de qualquer gênero exercitam o sagrado direito de ir e vir. Com o atropelamento do nosso amigo jornalista da velha guarda, figura ímpar, Manoel Vieira dos Anjos inconfundível no magistério da nossa a sua encantadora cidade. Hoje é emérito professor muito estimado de seus inúmeros colegas.

Sugerimos que os ilustres e dignos representantes das forças políticas da nossa cidade centenária, estejam atentos no sentido de evitar, por intermédio dos representantes do trânsito em Garanhuns, constante atropelamentos que se tem verificado na movimentada Rua 15 de Novembro.

No caso do nosso querido professor Vieira, o nosso universo intelectual, pontilhado de lembranças de que o amor é inesgotável na fonte do coração. Vem se multiplicando dia-a-dia os eternos tesouros da humanidade. O mundo do autoconhecimento prepara melhor ordenamento dos dias presentes. Essa nova dimensão revela o amor naquilo que faz, para fazer outros felizes, a sua profissão, em qualquer parte, e circunstâncias, será sempre um rio de bênçãos. Essa sempre foi a linha mestra do nosso raciocínio sobre a conduta moral e cultural do nosso amigo de todas as horas.

* Este comentário foi feito antes do falecimento do inesquecível Manoel Vieira dos Anjos, ocorrido no dia 29 de junho de 1985.

(*Advogado, jornalista e historiador | Garanhuns, 06 de julho de 1985).

sexta-feira, 10 de maio de 2024

Recordações

Garanhuns Antiga/Rua Santo Antônio na década de 1930

Dumuriê Vasconcelos*

Nesta manhã cinzenta de domingo, dia de São João eu caminho novamente pelas ruas de Garanhuns. É tempo indeciso; não há chuva nem sol. Mas que importam a mim variações atmosféricas, se estou no meu "habita"? Não sou como personagem de CAMUS, que era estrangeiro em sua própria terra. Por isso, piso forte neste chão que é meu. Mas... que busco agora, nesta fria manhã de inverno, nas ruas de minha cidade? Talvez coisas que só existem mesmo dentro de mim. Busco visões do passado. Qual Hamelet tapuio, eu procuro fantasmas de pessoas e coisas mortas. E como diria Alexandre Herculano, "as larvas da imaginação" me trazem tudo de volta, novamente. Na Av. Santo Antônio, recordo o Cine Glória com o velho Santino de porteiro. Félix Ruy Pereira, da Livraria Helena, editando o Almanaque de Garanhuns de 1936 e fazendo feiras de livros. D. Elisa Coelho, dama nobre da sociedade, em cujos salões se tocava piano e se declamavam versos. O "ficus benjamin" da calçada, sob cuja copa conversavam Dr. Lito de Azevedo, Dr. João Domingos da Fonsêca, Sady Orani, Zé de Souza, Luiz Lira e Ruber van der Linden. Detenho-me um pouco em Ruber. Foi meu professor no Colégio Quinze de Novembro. Certa vez interrompeu minha prova de física e meu deu ZERO, sob alegação de que eu estava "filando". Perguntei como poderia ter sido isto, pois o papel ainda estava "em branco". Um tanto indeciso ele respondeu: "Se você não filou, teve vontade." Pecou por pensamento. "Mas na prova seguinte, a melhor nota da classe foi a minha. Então ele me fez um elogio estranho: "Vejo que o senhor seu pai andou-lhe esquentando os couros! "Assim era Ruber. No Colégio, uma fera; na rua, um amigo. Perto da Matriz de Santo Antônio, revejo o antigo consultório do Dr. Tavares Correia onde em 1942, moço de 22 anos, eu fiz exame de saúde para ingressar no Banco do Brasil. Dr. Tavares me mandou tirar a roupa. Quando eu estava completamente despido, ele gritou: "Maria Amélia, vem cá!" Apavorado, eu exclamei: Dr. não faça isto! Dr. Tavares me respondeu sorrindo: "Deixa de besteira rapaz. Enfermeira não tem sexo!".  Ora, Maria Amélia era minha vizinha. Nunca mais pude fitá-la de frente. Coitada! Soube agora que ela faleceu em estado de extrema pobreza. Paro, na Rua Dr. José Mariano, diante do casarão do falecido português Bernardino Ferreira Guimarães. Muitas vezes, vi-o de manhã, com boné na cabeça e tesoura na mão "podando as uvas", como ele dizia. Talvez sem saber que empregava corretamente a sinédoque... Nunca me esqueci do letreiro que ele mandou pintar, na parede interna do Armazém Jacaré, onde negociava com cereais: "O TRABALHO É AMARGO, MAS SEUS FRUTOS SÃO DOCES E APRAZÍVEIS".

Lembro o Cel. Otávio Rêgo, conhecido como Coronel Bimbe. Certa vez um soldado do Tenente Manuel Neto quis revistá-lo. O Cel. Bimbe zangou-se e exclamou: "Perfile-se, atrevido, e faça continência. Você está falando com um herói da Guerra do Paraguai". E assim, uma multidão de fantasma vai surgindo... Rafael Vieira de Melo, meu tio por parte de mãe, comerciante rico mais inculto, me perguntando: "Esse Calabar, em quem você tanto fala, é aquele CITADO NA BÍBLIA?". A recordação é melancólica, mas a pergunta é de fazer rir. E lembro ainda o velho Cícero Guerra falando com sabedoria: "Quem chupa laranja, bebe água". O velho Tranquilino Viana, subcontador do Banco de Garanhuns, dizendo aos colegas. "Cheguei hoje pra trabalhar e a porta ainda estava fechada". Um gaiato perguntou: "E por onde entrou, seu Tranquilino?". José Elesbão, ator do Grêmio Polimático, me censurando: "Admiro-me de que você, moço de família e aluno do Colégio evangélico, ande lendo livro imoral". O livro era "Capitães de Areia" de Jorge Amado. E os tipos populares? Simão Ramos Dantas, bêbado, dizendo-se Rei de Portugal. O carregador Estevão brigando com quem lhe chamava "Estevão Rico Istibi". O preto Borborema, embriagado, fazendo discurso e reclamando do Prefeito, porque colocava banco pra namorado nos jardins, mas não instalava um alambique público para a pobreza... Cinzino, que ficou pobre e que perdeu as faculdades mentais; tudo porque comprou desvalorizados marcos alemães na Primeira Guerra Mundial. Todos os dias entrava no Banco do Brasil para reclamar o seu dinheiro. Mas... chega de tanta saudade! (*Texto transcrito do jornal O Monitor | Garanhuns, 28 de julho de 1979).

Dois dedos de prosa com o professor Carlos Ubirajara


O GEÓGRAFO E PROFESSOR CARLOS UBIRAJARA É O ENTREVISTADO DESTA SEMANA DO PROFESSOR CLÁUDIO GONÇALVES

Carlos Roberto Cruz Ubirajara é Doutor em Geografia pela Universidade Estadual do Ceará, Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista em Metodologia do Ensino Superior e Programação do Ensino de Geografia pela Universidade de Pernambuco. Especialista em Metodologia do Ensino de Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco e Licenciado em Geografia pela Universidade de Pernambuco. Nesta entrevista, o geógrafo e educador Carlos Ubirajara nos fala de suas origens, sua trajetória acadêmica, suas pesquisas e produções no campo da Geografia e da Educação. Carlos Ubirajara é um educador incansável que não para de trabalhar, pesquisar e se aperfeiçoar, lecionando Geografia Regional e Geografia Política na Universidade de Pernambuco/Campus Garanhuns, participando e ministrando palestras em seminários, conferências, simpósios e congressos e, concomitante estruturando dois livros promissores a partir de estudos sobre o turismo e as ações educativas em nossa região.

1. Professor Carlos Ubirajara, primeiramente fale um pouco de você e de suas origens?

R - Eu sou Carlos Roberto Cruz Ubirajara, Especialista em Educação e em Metodologia do ensino de Geografia, Mestre e Doutor em Geografia, professor da UPE/Campus Garanhuns, natural de Águas Belas-PE, descendente de família tradicional naquele município. Minha mãe a professora Edméa Cruz Ubirajara natural de Caruaru e formada no Colégio Sagrado Coração daquela cidade em 1943, foi uma das pioneiras em nossa região quando da implantação de uma pedagogia nova no Brasil em um período em que havia a necessidade de uma proposta de superação do método tradicional de ensino, vinculado aos jesuítas, sobretudo, na superação de um modelo elitista de escola. Transferida de Caruaru para Bom conselho em 1948 foi uma das agentes de um método de ensino, que buscava instituir uma luta social e política pela ampliação da escolarização em nome de uma nova forma de organização social: a democracia, a partir da passagem do modelo de produção colonial para o agrário industrial tendo como prioridade acrescentar à instrução a inserção de valores morais para a melhoria da cultura da população, que deixa de viver no campo e vem para as cidades, em busca de melhores condições de vida. Acompanhei quando criança já nos anos sessenta, sua luta em prol de uma educação voltada para os princípios morais e éticos de um povo. Meu pai Acy Ivo Ubirajara, neto do Cel. Sátiro Ivo de Garanhuns e Cel. Nicolau Siqueira de Águas Belas, foi agente arrecadador do Estado o que seria hoje, auditor fiscal da SEFAZ e, também, fazendeiro. Assim, minha vocação de educador foi estimulada pela vivencia de uma mãe professora/educadora e, de um pai proprietário de terras e arrecadador de impostos, o que me possibilitou refletir sobre as condições de vida de um povo e a necessidade de compreender a lógica que permeia as engrenagens sociais e econômicas por meio da educação, encontrando respaldo na Ciência Geográfica. 

2. Antes de falarmos sobre suas produções acadêmicas, comecemos pelo início de tudo: O que despertou o seu interesse pela Geografia? Era mais o conhecimento geomorfológico ou outros campos de estudos?

R - A geomorfologia é apenas um campo da Geografia, esta ciência é muito mais abrangente, tem como objetivo principal compreender a lógica da organização dos espaços e a definição dos territórios. Busca entender a dinâmica de organização do espaço conforme o Geógrafo Milton Santos, enquanto um conjunto indissociável e contraditório de sistemas de objetos e sistemas de ações. Estabelecendo relações entre o contexto histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza, por meio da leitura do lugar, enquanto relação efetiva, sentimento de pertencimento, e, do território enquanto porção do espaço definido por e a partir de relações de poder. Sendo analisado, através da leitura do texto, que a sociedade e a natureza imprimiram sobre a superfície terrestre que são as paisagens, que é nesse caso, a materialização física de uma sociedade que a construiu. Ou seja, por traz do que a gente vê existe uma dinâmica social que a determina. Desse modo, auxilia no planejamento das ações do homem sobre o espaço, buscando a compreensão das formas de relevo, dos fenômenos climáticos, das composições sociais, dos hábitos humanos nos diferentes lugares que são imprescindíveis para a manutenção da vida em sociedade. Neste sentido, essa ciência também, de acordo com Rui Moreira, passou a ser utilizada para desvendar as máscaras sociais, uma vez que revela como os sistemas econômicos, políticos, ideológicos e sociais se manifestam sobre as pessoas e sobre o espaço. Temas como a segregação espacial, o processo de favelização, a evolução e espacialização da violência e marginalidade são estudados e explicados em suas raízes pela Geografia, o que pode auxiliar no planejamento social, bem como nas críticas e ações populares que auxiliem no combate a este e outros problemas socioespaciais. Daí o meu interesse pela ciência geográfica.

3. Conte-nos um pouco sobre a sua formação acadêmica e sua trajetória como educador.

R - Como já frisei, a partir do momento que decidi ser um educador busquei e busco me aperfeiçoar sempre para contribuir com alguma coisa e para valorizar o mundo. Para tanto, fiz graduação em Geografia pela UPE, especialização em metodologia do Ensino Superior e em Programação do ensino de Geografia também pela UPE, Especialização em Metodologia do Ensino de Geografia pela UFPE. Mestrado em geografia pela UFPE e Doutorado em Geografia pela - UECE - Universidade Estadual do Ceará. Iniciei minha vida profissional lecionando no Colégio Municipal Gerson de Albuquerque Maranhão em Águas Belas-PE quando era apenas Técnico em Contabilidade (1974), em seguida na Escola Estadual João Rodrigues Cardoso na mesma cidade (1979), dez anos depois, em 1989, me submeti a uma seleção e fui selecionado para compor a equipe interdisciplinar (Geografia) na Gerência Regional de Educação do Agreste Meridional para implementar uma nova concepção de Educação já que estávamos saindo do Regime Militar. Já residindo nesta cidade de Garanhuns, onde tenho fincada raízes familiares, uma vez que sou bisneto de Sátiro Ivo, atuei como professor de Geografia durante seis anos no ensino médio do Colégio Santa Sofia. Atualmente leciono Geografia Regional e Geografia Política na Universidade de Pernambuco-UPE/Campus Garanhuns.

4. Qual a sua concepção do papel do profissional em Geografia?

R - Na sociedade atual, conforme afirmado por (Santos: 1997) graças à unicidade da técnica que possibilita a convergência dos momentos, configurando o que se denomina meio-técnico-cientifico-informacional, que impulsiona sobremaneira, o processo de globalização, torna-se evidente que os impactos das novas tecnologias impulsionam novos olhares, novos conceitos e, novas formas de produzir, consumir e pensar estimulando nesse sentido, novas posturas no campo educacional, a partir de uma escola voltada não apenas para ensinar conteúdos e sim desenvolver competências, para um mundo cada vez mais complexo e multifacetado, cheio de conflitos e contradições, para um novo mercado de trabalho, para sociedades multiétnicas e multiculturais conformando desse modo, um novo conceito de cidadania. Neste sentido, o processo de ensino e aprendizagem passou a exigir das práticas pedagógicas a organização de um currículo voltado para o desenvolvimento de competências e habilidades, inteligências múltiplas e atitudes, ou seja, novas formas de apropriação e compreensão de conhecimentos e saberes que possibilitem a formação dos sujeitos numa perspectiva integral, dinâmica e contemporânea. Diante do exposto, a Geografia está inserida neste processo, pois é uma ciência dos fenômenos cotidianos. Assim, no âmbito da sociedade da informação e na construção do meio técnico-científico-informacional, conforme já apontava Milton Santos, o professor se vê inserido em um ambiente em que muitas informações e dados sobre os mais diversos processos e fenômenos são disseminados no espaço da sociedade. Por isso, mais do que oferecer conteúdo escolares para os seus alunos, o profissional de Geografia tem a missão de auxiliá-los na absorção e na reflexão crítica de toda essa massa de informações que lhes chega todos os dias. Desse modo, o novo contexto tecnológico deverá propiciar as condições epistemológicas para o educando emancipar-se, sendo o aprender uma atividade contínua, e a emancipação total do sujeito é meta prioritária para toda a vida. Assim sendo, em função do aparato tecnológico vivenciado na atualidade, a escola deverá rever seus desafios, que é trabalhar o conhecimento, não só a informação. As novas tecnologias digitais têm um papel primordial nesses encaminhamentos, processar as informações, e a escola, sistematizar, normatizar, hierarquizar as mesmas. Neste sentido, o professor deverá ter noção da “realidade tecnológica” e das competências do novo aprendiz já que precisa desenvolver um novo perfil: ser pesquisador, não mais um repetidor de informações; articulador de saberes, não mais fornecedor único de conhecimentos; gestor de aprendizagens, não mais instrutor de regras; motivador da aprendizagem pela descoberta, não mais transmissor de informações empacotadas a serem assimiladas e reproduzidas pelo aluno. Neste sentido, o profissional em Geografia deve oferecer a partir de uma metodologia de ensino mais dinâmica e propositiva, as condições necessárias para que o educando compreenda as transformações estabelecidas no espaço geográfico de sua vivência, tendo em vista que o mesmo é dinâmico e complexo, e, a sua construção, se dá em função das relações que vão se estabelecendo entre o contexto histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza. Nesta perspectiva, Edgar Morin (2002), destaca que o homem cria o meio, e, este, por sua vez, cria o homem. Desse modo, homem e meio se retroalimentam. Pois, todas as formas de ações abstratas política/jurídicas estão conectadas a dinâmica das formas e dos conteúdos espaciais, uma vez que de acordo com George (1993), “toda a geografia é solidariamente, uma explicação da condição humana, mais precisamente, das formas e vicissitudes da existência dos homens nos espaços mais ou menos delimitados, uniformes e diversificados, num dado momento da evolução geral dos grupos humanos e seus confrontos”. Diante desse contexto, é possível reafirmar a importância do profissional de Geografia tanto para a pesquisa quanto para a formação de sujeitos que reconheçam a dimensão social de sua participação na apropriação do espaço, que é construída a partir da operacionalização de categorias e conceitos que fundamentam a ciência geográfica.

5. Como os conceitos geográficos de materialidade na configuração do espaço e de sua dinâmica sócio-espacial podem contribuir para uma visão de mundo e da realidade?

R - De acordo com o professor Antônio Carlos Robert de Moraes, uma primeira questão a ser considerada, que já contém uma diversidade incrivelmente grande, e que o planeta é naturalmente diversificado, há diferenças de lugar a lugar, de porção a porção da superfície da Terra. Existem diferenças zonais, de relevo, de clima, de vegetação, enfim, o mundo está dividido em biotas, biomas, em ecossistemas, termos que tentam dar conta (já numa visão sintética) da diversidade natural da Terra. Mas, além da diversidade natural, há que relevar a ampla diversidade das culturas. Os habitantes do planeta se formaram, vivem e convivem imersos em culturas diferentes, que vão redundar em diferentes formas de apropriação dos lugares, em diferentes construções sobre o espaço terrestre. As formas espaciais criadas por um grupo humano, por exemplo, revelam de imediato muito do acervo cultural e tecnológico que ele dispõe. Assim sendo, é necessário levar em conta os meios técnicos disponíveis, para entender as formas de instalação e de transformação dos habitats. Essas formas de construção, de organização, também respondem a arranjos sociais vigentes, isto é, os espaços construídos visam ser funcionais ao modo de vida de seus habitantes. Com isso eu quero dizer que é possível ler nas formas que se materializam na superfície da Terra, as relações sociais vigentes na época da sua edificação. Cada época cria as suas formas, cada modo de organização da sociedade gera as suas paisagens. Assim, é possível ler, nas formas criadas, os processos sociais que engendraram essas formas. Pode-se citar como exemplo o feudalismo que em um determinado momento cria a forma castelo e aldeia, o escravismo colonial que explica a casa grande e a senzala, e, num certo momento o capitalismo concorrencial pode ser lido na existência da fábrica com a vila operária do lado, assim como essa aglomeração na qual nós estamos inseridos hoje em dia é uma forma do nosso tempo. Em suma, as formas criadas, materializadas pela sociedade se ajustam à sociabilidade reinante. Desse modo, os lugares vão se tornando diferentes, não só por suas características naturais, mas também pelas heranças espaciais acumuladas, pelos espaços construídos que cada um contém. São heranças espaciais variadas. Para usar uma bela expressão do professor Milton Santos, essa diferenciação do espaço significa “tempo materializado na paisagem”. Os lugares têm uma temporalidade distinta, e cada época agrega, a um dado lugar, as formas que lhe são próprias.

6. Algumas das suas produções acadêmicas são voltadas para a análise geo-ambiental, diante dessa problemática, o que você considera relevante para elaboração de um planejamento territorial ambiental e necessidades concretas de desenvolvimento sustentável e educação ambiental, tendo como campo de estudo Garanhuns e Agreste Meridional.

R - Como sabemos o espaço geográfico é a porção da superfície terrestre que abriga as sociedades, envolvendo também os pontos utilizados para a exploração e consumo dos recursos naturais. Não se trata apenas de um palco ou um produto, pois ele é resultado e também resultante das ações humanas. Diante do exposto, torna-se imperativo compreender que além do próprio ser humano, compõem o espaço geográfico todas as suas obras e os meios naturais que interferem em suas atividades, como as cidades, as plantações, o meio rural, as indústrias, os objetos, os rios, os climas etc. Desse modo à produção do espaço geográfico - ou seja, o processo pelo qual o homem transforma e habita o meio em que vive - depende da natureza. A partir da exploração e do aproveitamento dos recursos naturais, o ser humano desenvolve as suas atividades para a sua reprodução e sobrevivência. Dessa forma para o desenvolvimento de um estudo e/ou planejamento geo-ambiental sustentável devemos analisar a paisagem não apenas a partir da simples localização deste ou daquele objeto geográfico particular, mas a distribuição de todos os objetos e as diversas fisionomias de conjunto que revelam o meio, influenciando desse modo na forma pela qual os homens interagem com o seu entorno, tirando proveito do mesmo. Desse modo, ao estudarmos a região de Garanhuns, deveremos buscar a compreensão de que o espaço é uma localização física, uma peça de bem imóvel, e ao mesmo tempo o local geográfico da ação e a possibilidade social de engajar-se na ação. Num plano individual, por exemplo, ele não só representa o local onde ocorrem os eventos (recebe), mas também significa a permissão social de engajar-se nesses eventos (função da ordem social).

7. Uma das temáticas que também envolvem o seus estudos é a difusão da função turística e o Ecoturismo. Neste sentido, como você avalia a reorganização sócio-espacial do município no contexto do seu desenvolvimento turístico? Quais as potencialidades, perspectivas e desafios?

R - A Região de Garanhuns oferece um patrimônio de paisagens pouco usuais e de extrema beleza que vão desde a presença de remanescentes de vegetação florestal de altitude, até esculturas naturais e cachoeiras de águas frias e permanentes. Há uma combinação rara de patrimônio natural e estrutura de assentamentos tradicionais (fazendas e sítios). Neste sentido a região que já foi calçada pelo pisar vigoroso das boiadas e que se tornou importante devido ao consorcio das atividades agropastoris abre-se também agora - em função da implementação das atividades turísticas - àqueles que a procuram pelo interesse de investir em hotéis (urbanos ou hotéis fazendas), bem como em atividades associadas aos eventos em um cenário de um verdadeiro Oásis - área ecologicamente diferenciada - em pleno interior do nordeste semiárido. Assim a difusão da função turística na Região de Garanhuns está relacionada com os condicionantes naturais, uma vez que a mesma possui características diferenciadas daquelas dominantes no semiárido do Agreste Pernambucano. Isto possibilita a implementação de iniciativas de uso turístico na região, um turismo diferenciado, peculiar e raro, do tipo serrano e interiorizado, o que contrasta com o padrão dominante do turismo comumente desenvolvido no nordeste do Brasil (Padrão litorâneo/praias ou que os estudiosos chamam do tipo SSS: ‘sun’ = sol, ‘sea’ = mar e ‘sand’=areia). A inserção dessa nova dinâmica funcional começa por redefinir a região funcionalmente, ao mesmo tempo em que redesenha as paisagens, e reforça características herdadas (história, fazendas, café) nessa área integrante do agreste meridional Pernambucano. A difusão do turismo tem sido extremamente relevante na organização e redefinição da dinâmica de uso do solo regional e, por conseguinte das alterações ocorridas nas paisagens, alterações ocasionadas pela implementação de uma nova via de turismo interior, integrando a região de Garanhuns a dinâmica dos serviços turísticos, e criando rupturas nos estilos de vida das populações regionais ao alterar códigos de valores, padrões de consumo e horizontes profissionais e de negócios (abertura de bares, restaurantes, postos de gasolina, hotéis, etc.). Diante do exposto a região tomou um grande impulso e vem buscando melhor se equipar para receber os visitantes vindos de toda parte do nosso Brasil a procura dos seus hotéis, de seus colégios, de suas fazendas, de seus encantos serranos. Este progresso evidenciou-se na configuração das paisagens com o crescimento e estilização dos equipamentos urbanos (Parques, ruas saneadas e pavimentadas, cinemas, praças e ajardinamentos e etc.) além do incremento do comercio local. Porém, torna-se imperativo e necessário valorizar os seus espaços de cultura, como por exemplo, o centro cultural, um belo patrimônio que precisa de mais cuidados. Além de uma melhor qualificação dos agentes sociais e econômicos locais envolvidos com o processo. Por exemplo, taxistas, empresários, funcionários de hotéis, bares e restaurantes precisam conhecer além da técnica de atendimento, os valores e atrativos locais para quando questionado saber responder adequadamente. Vender de forma positiva a imagem de Garanhuns e Região. Desse modo, o desencadeamento das atividades turísticas cria mudanças - uma vez que também impulsiona os agentes públicos (Estado e Município) - em fragmentos do ambiente físico e sócio cultural do município e região redefinindo e redesenhando paisagens.

8. Garanhuns-PE, Ações Educativas e Dinâmica SocioEspacial: Um Análise Geo-histórica das Relações Estabelecidas entre Religião, Estado e Educação foi sua tese de defesa do Doutorado pela Universidade Estadual do Ceará. Que contribuições a pesquisa trouxe para a compreensão da análise de espacialidades, complexidade das ações dos agentes (sociais, políticos e econômicos) e das alterações sócio-espacial?

R - As ações educacionais materializadas a partir da implantação e expansão de instituições educativas resultam no desenvolvimento de sistemas de objetos, sobretudo aqueles relacionados ao ensino bem como, no surgimento e potencialização de fluxos e/ou sistemas de ações correlatas. Em nossa pesquisa, percebe-se que as diversas ações educativas, desenvolvidas ao longo de um contexto histórico, ocasionaram diferentes formas de uso do solo, refletindo-se isto diretamente na dinâmica das paisagens tendo em vista que as referidas ações educacionais operacionalizadas pelo Estado, Município e pelas igrejas (Católica e Presbiteriana) em Garanhuns-PE a partir da instalação das instituições de ensino (Fundamental, Médio e Superior) estão correlacionadas/associadas com a materialização da dinâmica socioespacial e na definição de territórios, ou seja, as ações educativas ancoradas nas normatizações estatais à partir da instalação de instituições de ensino em Garanhuns-PE estão correlacionadas/associadas com a dinâmica socioespacial. Entretanto, apesar da reconhecida importância desses estudos, a análise das espaciais advindas de ações na área educacional ainda não se acha muito presente na produção acadêmica nacional, muito embora, os estudos sobre geografia urbana e serviços analisem o assunto, apenas como reflexo das políticas de desenvolvimento econômico. Neste sentido, reduzir essa análise tão somente como consequência de outros macroprojetos políticos institucionais, ao nosso ver, sempre inviabilizaram pesquisas que tivessem a probabilidade de analisar a dinâmica sócio espacial tendo, como fundamento maior, projetos no âmbito educacional. Desse modo A minha pesquisa busca oferecer uma contribuição ao estudo desta temática. Tem por objetivo compreender como as ações educacionais a partir da instalação de instituições de ensino passam a desempenhar a função articuladora no contexto urbano e regional em que estão inseridas. Para o entendimento desse processo partimos do pressuposto de que a organização da dinâmica sócio espacial, ocasionada pelas ações educacionais, enquanto práticas espaciais, promovidas inicialmente pelas igrejas e pelo Estado, viabilizaram uma demanda para o desdobramento do ensino superior, propiciando desse modo a instalação e ampliação das referidas instituições em Garanhuns-PE - em meados dos anos 60 (UPE) e AESGA e a partir de 2005 (UFRPE/UAG) e várias outras IES. Desse modo as práticas espaciais estabelecidas a princípio pelas igrejas (Católica e Presbiteriana), possibilitadas pelo Estado, criaram uma estrutura educacional de referência na região, pela concentração de estabelecimentos de ensino de qualidade, instituindo desse modo uma centralidade regional, direcionando sobretudo fluxos e refluxos de pessoas e ideias e propiciando desse modo, novas demandas sociais e econômicas. Podemos então concluir que a criação desse polo educacional, considerando que esta ação localizada em um núcleo urbano criou processos e formas espaciais concentradoras de um determinado serviço, juntamente com outras ações políticas, consorciado a um ecossistema diferenciado no semiárido nordestino, foi responsável por uma nova lógica espacial e uma concentração populacional expressiva, gerando vida e movimento ao espaço urbano, transformando Garanhuns na principal cidade do agreste meridional pernambucano.

9. Pretende publicar futuramente um livro a partir desta tese?

R - Pretendo sim, estou apenas atualizando dados e muito em breve estarei lançando os dois trabalhos, os estudos sobre o turismo e as ações educativas em nossa região.

10. São muitos geógrafos que tem contribuído para a compreensão da configuração e produção do espaço. Que correntes filosóficas e geógrafos se alinham ao seu pensamento geográfico contemporâneo?

R - O entendimento dos mecanismos e da importância dos fatos geográficos, naturais, culturais e econômicos passa necessariamente pela compreensão do significado do espaço geográfico, definido por Milton Santos (1994) em sua vasta obra sobre o assunto, como um [...] conjunto indissociável de que participam de um lado, certo arranjo de objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e, de outro, a vida que os preenche e os anima. Nesta perspectiva, avalia-se que as ações humanas enquanto ação pontual que tem repercussão no próprio ponto e no que está à sua volta, ou seja, no seu entorno, compõe a ideia de espaço geográfico que passou a ser constituída a partir do conjunto de localizações e de ações vividas. Dessa forma evidencia-se por sua vez, a questão da identidade territorial que no dizer de Santos (1999, p. 08): (...) não é apenas o conjunto dos sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como o território usado, não o território em si. O território usado é o chão, mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer àquilo que a nós pertence. Reportamo-nos também - estabelecendo é claro, as devidas adequações - as teorias desenvolvidas por Zeny Rosendahl (2001) onde a autora formula teorias acerca da Geografia e Religião, tendo como maior desafio esquadrinhar o entendimento das dinâmicas espaciais envolvendo a religião e sua influência na organização espacial. Este comparável facilita e auxilia na compreensão da dinâmica espacial permitida pelas ações educacionais. E, grandes outros Geógrafos como: Rui Moreira, Antônio Carlos Robert de Moraes, Paulo Cezar Gomes, só para citar alguns.

11. Diante do mundo globalizado e seus eternos conflitos, qual a contribuição da Geografia para a compreensão da Nova Ordem Mundial?

R - Globalização é o ápice do processo de internacionalização do mundo capitalista, e para seu entendimento devemos levar em conta: o estado das técnicas e o estado da política. As técnicas são oferecidas como um sistema e realizadas combinadamente através do trabalho e das formas de escolha dos momentos e dos lugares de seu uso. Portanto, a globalização não é apenas a existência desse novo sistema de técnicas, é também o resultado das ações que asseguram a emergência de um mercado dito global, responsável pelo essencial dos processos políticos atualmente eficazes. Neste sentido a contribuição da ciência geográfica está contida em sua finalidade que é compreender a dinâmica social e espacial, que produz, reproduz e transforma o espaço geográfico nas diversas escalas (local, regional, nacional e mundial). Desse modo as relações socioespaciais devem ser consideradas tendo em vista a historicidade do espaço, não como enumeração ou descrição de fatos que se esgotam em si mesmos, mas como processo de construção social numa relação estabelecida entre o contexto histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza.

12. Reconhecido no campo educacional, qual a sua visão de Educação e Sociedade?

R - Historicamente os sistemas educacionais capitalistas vêm desenvolvendo mecanismos de filtragem social para garantir o acesso diferenciado aos diversos graus e ramos de ensino que terminam por privilegiar o acesso e permanência no sistema escolar dos representantes da classe dominante e de seus aliados, contudo a socialização da política nas sociedades contemporâneas, ao proporcionar às classes menos favorecidas maiores espaços de controle social da riqueza e do poder - apesar de que nos dias atuais, estamos sofrendo uma pressão muito grande, por parte do governo recém instalado em nosso pais, quando observa-se a tentativa de desqualificação das universidades e dos educadores, demonizando-os-vem possibilitando também o controle social da produção e da transmissão do saber. O controle democrático das políticas educacionais constitui, desse modo, um elemento fundamental para que a escola garanta, ao trabalhador, conteúdos necessários à compreensão e à intervenção na civilização técnico científica, instrumental político indispensável ao exercício pleno de sua cidadania. A sensação de que se vive em uma época de grandes transformações que se desdobram em novos desafios e oportunidades deixou de ser um dado subjetivo para se tornar uma diretriz que orienta a agenda de governos e a atuação de movimentos sociais, partidos políticos e organizações públicas e privadas, inclusive instituições de educação superior e centros de pesquisa.

13. Se pudéssemos usar os óculos da Geografia como enxergaríamos o mundo em nossa volta?

R - Extremamente complexo e multifacetado, cheio de conflitos e contradições, torná-lo inteligível é, para nós geógrafos, uma tarefa inicial. Decifrando-o, como diz Lefébvre, revelamos as práticas espaciais dos diferentes grupos que nele produzem, circulam, consomem, lutam sonham, enfim, vivem e fazem a vida caminhar.

14. Atualmente está trabalhando em novos projetos?R - Sim, além da atualização de dados dos meus trabalhos sobre a Região de Garanhuns e a Difusão da Função Turística (Dissertação de Mestrado) e Ações Educativas e a Dinâmica Socioespacial (Tese de Doutorado) para publicação, estou trabalhando também na orientação do programa Residência Pedagógica da CAPES em parceria com a UPE, que naturalmente rendera boas produções textuais sobre o assunto.

15. Agradeço pela oportunidade de entrevistá-lo e peço-lhe que deixei uma mensagem aos seus alunos, amigos de profissão e aqueles que pretendem seguir formação em Geografia.

R - Eu é que agradeço a atenção e, me ponho sempre à disposição para quando se fizer necessário uma boa conversa. Aos meus queridos alunos só tenho a dizer que, como afirmado por Jigoro Kano fundador do Judô: “só se aproxima da perfeição quem a procura com constância, sabedoria e, sobretudo com muita humildade”. Vamos à luta!

*José Cláudio Gonçalves de Lima, Garanhuense, professor, Pós-graduado em História, Pesquisador, escritor e Sócio fundador do Instituto Histórico, Geográfico e Cultural de Garanhuns.

ORAÇÃO A MÃE

João Marques | Garanhuns Ave, mãe te invoco santa pela graça do céu e a bênção da vida nessa terra em construção mãe que multiplica ama e am...