quinta-feira, 2 de maio de 2024

Os desfiles do Colégio Diocesano


João Marques*

Desfilar foi para mim, nos tempos do Ginásio, um orgulho incomparável. Menino vindo do sítio, humilde, encontrando-se como aluno do Colégio Diocesano e em meio à Avenida Santo Antônio, imensa e cheia de gente, dava-me a sensação de um grande triunfo. Desfilava com os pés e com o coração. Nos dias 7 de Setembro, em homenagem à Pátria, no 12 de Outubro, desfilava pela festa de aniversário do Colégio. O 12 de Outubro, em Garanhuns, é do Colégio Diocesano, embora se comemorem também o Dia da Criança, o Descobrimento da América e o dia de Nossa Senhora Aparecida.

Dias antes das paradas, Mons. Adelmar fazia recomendações na Capela. Sempre queria brilho no desfile do Colégio Diocesano. Preparar a farda, cortar o cabelo, engraxar os sapatos. Nada de farda velha, desbotada. Uma vez - mais para asseverar os seus cuidados - chegou a dizer que quem não tivesse graxa, passasse uma casca de banana, para os sapatos brilharem.

No campo, atrás do Colégio, por 2 ou 3 vezes, os alunos eram treinados. Marchava-se para lá e para cá sob os comandos de um censor. Mãos espalmadas, pelo saliente, balanço elegante dos braços, cobertura, passo certo. A formatura no dia do desfile demorada. Professores, funcionários do Colégio apressavam-se, na  árdua tarefa de arrumar os pelotões. Uma vez, para ganhar tempo, foi recomendado na véspera, no último ensaio, que todo o mundo marcasse o lugar na fila, olhando bem a cara do companheiro da frente e da retaguarda, e, não custasse, fosse marcado no chão com algum sinal o lugar. Assim, foi feito. Gravei (para o resto da vida) as duas fisionomias e intimidei-me com uma pedrinha que, também, se perfilava, presa no chão. Embora não tenha acreditado muito, no outro dia, em poucos minutos, estava o Colégio pronto para sair.


Antes do "marche" definitivo, D. Almira - a eterna secretária - saía arrumando os pelotões, com bandeirolas, faixas, distintivos. Maiores cuidados, porém, eram dispensados à banda marcial e aos pelotões das bandeiras. Havia um, com todas as bandeiras dos estados do Brasil (e ainda hoje há). Fui eu certa vez escolhido para conduzir uma das bandeiras, a de São Paulo. Com quanto orgulho, pude segurar sobre o ombro o mastro pesado de uma bandeira esvoaçante. Grandiosa incumbência, grande estado brasileiro. Pesou-me, como e meu esforço estivesse a equilibrar um dos maiores edifícios de São Paulo. Logo eu, menino vindo do sítio, humilde.

Enfim, ao toque da corneta de comando, a banda marcial estrondava e lá ia o Colégio Diocesano pela cidade em festa, fazendo das ruas, praças. As calçadas, cheias de palmas espontâneas, formavam outras filas, e as mãos ritmos nos compassos de sons da alma. Garanhuns festiva, em dias como estes, torna as suas cores mais bonitas. Tudo tem a cor, a brisa, as emoções de um desfile. A amarelo e a listra vermelha da calça, por onde passam, fazem as avenidas, caminhos amplos do "astro brilhante, que anima e aquece". Ivo de Souza, de mais saudosa memória, locutor então da antiga Rádio Difusora de Garanhuns, a bradar ao microfone: "É um espetáculo maravilhoso!" E todos marchavam bem, como fazia sido recomendado. E todos sentiam - como eu - o prazer de ser do Colégio Diocesano. Desfiles, dias cívicos, que se  tornaram mais que isto, eternos.

O Mons. Adelmar, acompanhando o pelotão formado pelos meninos do "Jardim da Infância", sorria e agradecia os aplausos. O último e o mais primeiro dos pelotões. E o Mons. Adelmar o mais criança, de alma e de gestos puros. Obediente a Deus e servidor dos  homens, dos homens-crianças, ensinando a eles, também, a nunca deixaram de ser crianças.

Quando o Colégio recolhia-se outra vez à Praça da Bandeira, antes de retornar a forma granítica do Templo, e efervescia numa  grande manifestação. O Professor Lustosa, de cima de uma das pilastras do muro, expressava em voz alta, qual "a voz do clarim na alvorada", alegria e exaltação ao Colégio. A banda, incansável, respondia em rebates de tambores e em toques especiais de cornetas, com a força de mil braços e de mil pulmões. Gritos, palmas... e lágrimas nos olhos de poço, dos ex-alunos vindos do outro lado da Praça.

Hoje, saudoso como os que choram, torno quando quero às Avenidas e assisto a tudo que ficou no coração, nas pedras e nas brisas renovadoras. E a alma tange os desfiles indeléveis, onde outra vez vejo - e estudante, aluno do Colégio Diocesano de Garanhuns, com as fontes decantadas nos olhos e, no peito, o garbo de um general.

*João Marques dos Santos, natural de Garanhuns, onde sempre residiu, é poeta, contista, cronista e compositor.  Teve diversas funções nas atividades culturais da cidade: foi Presidente da Academia de Letras de Garanhuns, durante 18 anos, Diretor de Cultura do Município e, atualmente, é presidente da Academia dos Amigos de Garanhuns - AMIGA. Compôs, letra e música, o Hino de Garanhuns. Mantém, desde 1995, o jornal de cultura O Século. Publicou quatro livros de poesia: Temas de Garanhuns, Partições do Silêncio, Messes do azul e Barro.

(Texto transcrito do Livro Colégio Diocesano de Garanhuns -  Cem Anos de Ciência e Fé - Manoel Neto Teixeira / 2015).

Fotos: (1) - João Marques (2) - Anchieta Gueiros desfilando em 1979, segundo na fila.

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